Um doente, duas doenças
Artur foi internado em 1957 no Hospital Colónia Rovisco Pais, tinha 58 anos de idade, era solteiro e vivia sozinho e sobrevivia do que cultivava. Natural e residente em Fafe, foi identificado por uma Brigada. O seu estado de saúde era preocupante, e em 1964 o seu caso clínico foi publicado na Revista Portuguesa de Hansen – Rovisco Pais.
Feito o rastreio, os exames ao muco nasal e pele tiveram resultado positivo. A lepromino-reação – Mitsuda deu negativa e o diagnóstico histológico foi compatível com o tipo de lepra – lepromatosa.
Não foi possível apurar a fonte de contágio ou averiguar a existência de antecedentes familiares. Desde novo que Artur tinha cifo-escoliose e pequenos nódulos moles pendurados na fronte, pescoço, peitorais, dorso, nádegas e pernas e há cerca de 18 anos que sofria de dores no estômago, náuseas e vómitos. Além destes dados, à data do internamento, eram visíveis sinais de infiltração eritematosa na face e fronte e nódulos diferentes tamanhos.
No decurso do seu internamento teve vários surtos de lepro-reacção de tipo eritema nodoso, com febre alta, nevralgias dos membros, dores osteo-articulares e agravamento da sintomatologia gástrica.
Os exames radiológicos revelaram sequela de úlcera gástrica e duodenite.
Após dois anos de terapêutica medicamentosa a baciloscopia deu negativa mantendo-se positiva na pele, com aglomerados de bacilos de Hansen, designados globias, por isso, continuou internado no Hospital.
Contudo as queixas e o estado global do doente pioraram, com dores de cabeça e estômago, intolerância aos alimentos, mesmo líquidos, convulsões, depauperamento físico, e apresentando-se prostrado no leito e com sonolência.
Alargou-se o espectro de análise e além do diagnóstico de doença de Hansen, verificou-se ser um doente com neurofibroma cutâneo.
A persistência de sintomas acaba por fazer desconfiar de um tumor no sistema nervoso central ou neoplasia gástrica. A custo, devido ao seu estado clínico, foi possível realizar uma radiografia ao crânio em outubro de 1963, a qual reforçou a hipótese de tumor cerebral.
O doente acabou por falecer em janeiro de 1964. A biopsia realizada no hospital e analisada em laboratório acabaria por revelar um tumor maligno agressivo de tipo glioblastioma no cérebro.
Além de Lepra Lepromatosa sofria de doença de von Recklinghausen, uma doença genética que afeta a pele e o sistema neurológico.
(Baseado em documentos do Arquivo do HCRP e Revista Rovisco Pais. Pesquisa e redação por Cristina Nogueira – CulturAge)