Uma família, uma casa...

António foi com receio para o Hospital Colónia Rovisco Pais mas com esperança de ficar curado.
Quando entrou foi sujeito a um rigoroso exame médico que incluía um exaustivo registo fotográfico das lesões. Um enorme questionário sobre sintomas, antecedentes familiares e condições económicas e sociais, cujas respostas eram preenchidas pelos enfermeiros, médico e assistentes sociais resultaram no preenchimento de vários formulários.
O mesmo aconteceu com a filha, a mulher e a sogra, também elas com a doença de Hansen.
O diagnóstico foi lepra lepromatosa.
A casa que lhes foi atribuída ficava num dos bairros que o Hospital tinha e era muito melhor do que a barraca onde viviam. Possuía água canalizada e luz elétrica, bem como um quintal onde pôde cultivar uma horta e fez criação de galinhas e coelhos.
Os medicamentos eram facultados pelo Hospital, e ministrados por injeção. Ali tinham todo o tipo de acompanhamento médico, incluindo dentista.
A doença teve fases de regressão e fases de reativação, estas bastante dolorosas. Por vezes surgiram outras complicações, a que os médicos chamavam intercorrências, que mereciam acompanhamento mais prolongado, e em alguns casos cirurgias. Regularmente faziam colheitas para análises no laboratório do Hospital.
António melhorou um ano após a entrada no Hospital, e passou a estar apto para trabalhar. Aprendeu o ofício de sapateiro e a sua mulher aprendeu a fazer costura e bordados.
Colaboravam nas brigadas de trabalho e recebiam uma remuneração pelo seu trabalho, a qual acumulavam para no futuro proverem a despesas que surgissem.

A filha aprendia também as primeiras letras com as irmãs de S. Vicente de Paulo, e ali fez a primeira comunhão. Os colegas de escola não a excluíam.
De vez em quando a concertina de António enchia de alegria as pequenas festas e bailes do núcleo em que viviam.
Ali estavam longe de tudo, tinham que cumprir regras a que não vinham habituados, mas estavam juntos e não passavam fome, nem frio.
(Baseado em documentos do Arquivo do HCRP. Pesquisa e redação por Cristina Nogueira – CulturAge)

